terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Evo: industrializar, atacar pobreza e apurar fortunas suspeitas





Morales apresentou planos para impulsionar a partir de 22 de janeiro, quando assumem os 110 legisladores que o Movimento ao Socialismo (MAS) terá na Assembléia Legislativa Plurinacional. São mais de dois terços dos 166 totais.

"Há dois temas capitais que o governo deve cumprir: a industrialização, para que deixemos de produzir e exportar só matérias-primas como hidrocarbonetos e minérios, e a justiça social, que se resume numa luta frontal contra a pobreza", afirmou Evo

Descontraído e bem-humorado, Morales disse que dormiu mal por uma dor de estômago que se arrastava por dias. Ele não disse se era o nervosismo das eleições. E descartou a possibilidade de apresentar-se a um terceiro mandato, que seria de 2015 a 2020, ainda que tenha dito que a Constituição permitiria que concorresse.

Morales foi até certo ponto cauteloso, em contraste com a alegria desencadeada por seus partidários, que festejaram a noite toda, apesar da proibição do álcool. O contraste entre a sua vitória esmagadora e o pobre papel da oposição era evidente. "Acho que vencemos em sete dos nove departamentos do país", disse exultante o mandatário.

"Estou muito animado, quero agradecer ao povo boliviano, os diversos movimentos sociais, intelectuais, artistas, caminhoneiros, os dirigentes sindicais, todos e todas. E o meu respeito especial para as Seis Federações do Trópico de Cochabamba, que se mobilizaram em todo o país. Realmente foi um esforço de todo um povo. Esse esforço não será em vão, eu aprendi durante os quase quatro anos como presidente ", disse ele em tom comedido.

Sobre as declarações de seu opositor na disputa, Manfred Reyes Villa, no sentido de que seguiria com a polarização, Morales comentou que, "quando ele disse que há polarização, lamentavelmente só pensa nele mesmo e na direita e não no povo boliviano", ou , quem sabe, sublinhou, "está pensando, como em setembro do ano passado, em tentar um golpe de estado".

"Quando falam que vai haver polarização, se equivocam... Quando falam de narcotráfico, eles próprios estão envolvidos...", disse, rebatendo as críticas a sua política com relação ao cultivo da folha de coca - tradicional entre a população indígena, antes de ser matéria-prima para o refino da cocaína. "De onde vêm todos os bens de Reyes Villa nos Estados Unidos? De onde vem todo o dinheiro dele? Por que o Departamento de Estado não nos ajuda a investigar?", questionou Evo.

A justiça boliviana confirmou que Reyes Villa será ouvido nesta terça-feira como testemunha em um processo sobre a violenta repressão dos tumultos de outubro de 2003, que deixou 65 mortos. Naquela época, o partido de Reyes Villa integrava o governo presidido por Gonzalo Sanchez de Lozada, que fugiu para os Estados Unidos depois dos tumultos.

A convocação de Reyes Villa fora adiada por causa das eleições. O líder da oposição também é acusado de ter cometido irregularidades quando era governador da província de Cochabamba, um cargo que ocupou até 2008.

O convênio entre Bolívia e EUA no combate às drogas foi rompido no primeiro mandato de Morales, em meio a trocas de acusações - de conivência do governo sul-americano com os cocaleiros, por um lado, e de espionagem da DEA (agência americana de repressão), por outro. Ontem, Washington felicitou o rival pela votação "pacífica e ordeira" e manifestou o desejo de "trabalharmos juntos".

Corrupção

Morales destacou que, além do neoliberalismo, outro inimigo dos bolivianos é a corrupção. Ele explicou que propõe um projeto de lei tem como objetivo "investigar as fortunas suspeitas". Ele destacou que a oposição de direita vem barrando esta legislação há quatro anos graças à maioria no Senado.

No entanto, o Movimento Ao Socialismo (MAS) de Morales obteve domingo a maioria absoluta da Câmara alta. Assim, o partido socialista poderá legislar sem problemas já que manteve o controle da Câmara dos Deputados, que exerce desde 2005. Evo lembrou ainda que levantou o seu sigilo bancário nas eleições e desafiou os demais concorrentes a fazê-lo, o que não ocorreu."Os traidores ao processo de mudança e à pátria foram punidos pelos eleitores", disparou.

Ontem, o presidente se reuniu com seu gabinete, com executivos de empresas estatais, com os candidatos eleitos e os futuros candidatos a prefeito e prefeito nas eleições, que será em abril de 2010. Morales anunciou que viajará para Cuba, onde participará da cúpula de aniversário da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba), nos próximos dias. O mandatário boliviano também irá a Copenhague para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 15), encontro que acontece até o próximo dia 18.

Boas relações com todos

Durante pouco mais de uma hora de entrevista coletiva, o mandatário reiterou seu desejo de manter boas relações "com todos os governos", exceto com o regime de facto de Honduras. Sobre sua relação com países da região, Morales se disse satisfeito com o diálogo mantido com o Chile. La Paz reivindica uma saída para o mar, perdida para Santiago durante a Guerra do Pacífico, travada entre 1879 e 1883.

Além disso, Morales disse que suas divergências com o presidente do Peru, Alan García, não são pessoais, mas ideológicas.Também insatisfeito com as demarcações estabelecidas pela Guerra do Pacífico, o Peru tenta no Tribunal Internacional de Justiça de Haia uma redefinição dos limites marítimos e considera que a reivindicação boliviana pode atrapalhar seus planos.

Sobre o Brasil, o presidente reeleito afirmou que espera ter "um diálogo transparente e sincero" com quem quer que venha a suceder Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto em 2010. Segundo ele, há uma relação "sincera e fraterna" com Lula, e Brasil e Bolívia sempre manterão o diálogo. "Quando tivermos problemas de mercados e de preços, estaremos prontos para resolver, com o diálogo mais sincero, mais transparente", disse.

"Temos responsabilidades conjunturais e com nossos países. E o diálogo será sempre a via das definições, também na questão dos hidrocarbonetos". Morales disse que "às vezes, é preciso resolver de forma conjunta as demandas e problemas de ambos os países".

Morales contou que, na época da nacionalização dos hidrocarbonetos na Bolívia, logo depois que assumiu a Presidência em 2005, tentou "falar várias com o presidente Lula", "inclusive por meio de seus ministros". "Se apresentou o problema da nacionalização e foi um momento muito duro para o companheiro Lula", recordou. Naquela ocasião, o anuncio afetou diretamente a Petrobras, maior investidora direta na Bolívia.

O presidente boliviano disse que hoje a Bolívia exporta gás para o Brasil e Argentina com "preço solidário" e sugeriu que espera que os mercados vizinhos também sejam acessíveis para a exportação do produto têxtil boliviano. Para ele, os acordos "devem ser de (produtos) complementares" e o produto boliviano deve ter espaço "regional".

Vitória em São Paulo

Na primeira eleição na qual foi permitido que bolivianos que moram em outros países votassem, Morales obteve 95% dos votos válidos depositados em São Paulo, segundo informações do presidente da seção brasileira da Corte Nacional Eleitoral, o jornalista Jorge Gonzales. A apuração das urnas no Brasil mostra que 13.199 bolivianos residentes aqui votaram pela reeleição de Evo, de um total de 13.901 votos válidos. Houve ainda 74 votos em branco e 318 nulos.

O resultado seria enviado à Bolívia, para ser ratificado. No total, estavam inscritos em São Paulo 18,6 mil eleitores. O segundo colocado, Manfred Reyes Villa (PPB-CN), obteve 380 votos no Brasil, e Samuel Dória Medina (UN), 179. Os demais votos se dividiram entre os demais partidos que disputaram a eleição.

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